Brasil e Índia: parceria resiliente de duas potências da agricultura (Por Dalci Bagolin)
* "Nas últimas décadas, Brasil e Índia tornaram-se potências agrícolas. Ganhos em produtividade e sustentabilidade têm contribuído para a melhoria da segurança alimentar e do desenvolvimento sustentável, gerando benefícios significativos não só para os países, mas para todo o mundo. As partes interessadas da agricultura brasileira e indiana têm sido parceiros firmes para o avanço dessas metas, escreve Dalci Bagolin, Adido Agrícola, Embaixada do Brasil, Nova Delhi. "
Com i intuito de construir uma forte cooperação bilateral e na preparação da visita de Estado de Presidente Jair Bolsonaro para a Índia, em janeiro de 2020, a Ministra da Agricultura do Brasil, Tereza Cristina, manteve uma agenda repleta de reuniões com seus homólogos ministeriais na Índia, em que ambos os governos se comprometeram a expandir ainda mais nossa parceria em áreas-chave para o futuro.
Nos últimos 40 anos, os métodos de produção agrícola e pecuária do Brasil mudaram dramaticamente. O país passou de importador de alimentos a um dos maiores exportadores mundiais de produtos agrícolas. Durante este período, a produção agrícola brasileira cresceu 385%, enquanto a área de terra dedicada à agricultura aumentou apenas 32%. Essa transformação da agricultura e da pecuária é resultado de décadas de inovação e desenvolvimento para adaptar a agricultura aos trópicos, com ganhos contínuos de produtividade e intensificação da produção. Esse sucesso tornou o Brasil líder no cenário global de segurança alimentar. O Brasil usa apenas 30% de suas terras para a agricultura e pecuária, enquanto 66% de seu território permanece preservado com vegetação nativa. Em 2012, o Brasil aprovou seu Código Florestal, que cria o marco legal para a integração do desenvolvimento sustentável em suas três dimensões - ambiental, econômica e social - como elemento central da produção agrícola nas propriedades rurais brasileiras.
Nos últimos dez anos, o Brasil avançou bastante na implantação do Plano de Agricultura de Baixo Carbono (Plano ABC) no âmbito da Política Nacional de Mudanças Climáticas. O Plano ABC é uma política pública composta por um conjunto de ações que visa aumentar o uso de tecnologias agrícolas sustentáveis com alto potencial na mitigação de emissões de gases de efeito estufa e no combate ao aquecimento global. O Plano ABC já incorporou 59 milhões de hectares, o que representa 25% das áreas ocupadas pela agropecuária brasileira, representando um investimento de US $ 7 bilhões. A estrutura do Plano ABC inclui sete Programas: Recuperação de Pastagens Degradadas; Sistemas de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta e Sistemas Agroflorestais; Sistemas de Plantio Direto; Fixação Biológica de Nitrogênio; Florestas plantadas; Tratamento de Dejetos Animais; e Adaptação às Mudanças Climáticas. Uma iniciativa recente do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) é o Programa de Bioinsumos. O objetivo deste programa é incrementar a pesquisa e estimular o uso de produtos biológicos como inoculantes, promotores de crescimento de plantas, biofertilizantes, extratos de plantas e agentes de controle biológico para tornar a agricultura mais sustentável e econômica.
Na área da pecuária, o Brasil é um grande produtor de genética bovina. As raças indianas de Zebu contribuíram fortemente para esse cenário, mudando a história da pecuária brasileira, onde 80% do rebanho possui genética zebuína devido a sua alta adaptabilidade e níveis crescentes de produtividade. O Brasil é o maior produtor de embriões bovinos do mundo, sendo responsável pela produção de mais de 375 mil embriões em 2017, segundo dados da Embrapa Recursos Genéticos e Tecnologia. Para garantir animais de excelente qualidade genética no rebanho nacional, a Associação Brasileira de Pecuária Zebu - ABCZ conta com o Programa de Melhoramento Genético Zebu (PMGZ), que já avaliou cerca de 15 milhões de animais. O programa auxilia os criadores no processo de seleção, identificando animais precoces e férteis com melhores índices de produção de leite.
Diante desse perfil da agricultura brasileira atual, bem como das conquistas e desafios da agricultura indiana, podemos dizer que sustentabilidade, inovação e segurança alimentar são conceitos fundamentais, nos quais a cooperação entre os dois países pode trazer benefícios mútuos. Dentre as iniciativas de cooperação em andamento, podemos destacar os Memorandos de Entendimento (MoU) da Embrapa com o Conselho Indiano de Pesquisa Agropecuária - ICAR e com o Departamento de Pecuária e Leite - DAHD, o Programa Indo-Brasil Agritech de Incubação Transnacional de Startups, e o compartilhamento de experiências no programa de biocombustíveis à base de etanol.
A Embrapa, que possui 47 Centros de Pesquisa no Brasil e mais de 10.000 funcionários, é um dos maiores responsáveis pelo sucesso da agricultura brasileira, no que diz respeito à pesquisa e tecnologia agropecuária. O MoU entre a Embrapa e o ICAR visa as áreas de cana-de-açúcar, coco, búfalo e gado leiteiro. Ao mesmo tempo, o MoU com DAHD enfoca as tecnologias modernas de reprodução animal assistida para gado leiteiro, com particular atenção para o estabelecimento de um Centro de Excelência, mencionado na Declaração Conjunta assinada durante a visita presidencial em janeiro deste ano.
O Programa de Incubação Transnacional Indo-Brasil Agritech é uma parceria entre o Ministério das Relações Exteriores do Brasil e a Incubadora Pusa Krishi, que é um pólo de inovação e incubação do agronegócio do ICAR. O programa consiste na troca de Startups da Agritech para atividades de incubação entre os dois países. As cinco primeiras startups brasileiras vieram para a Índia no ano passado para atividades em Nova Delhi e Hyderabad. Assim que possível, cinco startups indianas irão ao Brasil para incubação em Piracicaba e Viçosa.
Em relação ao uso do etanol como biocombustível, a Associação Brasileira das Usinas de Açúcar - UNICA e o Governo Brasileiro vêm compartilhando a experiência do programa nacional de biocombustíveis com a Índia, principalmente no que diz respeito à mistura do etanol na gasolina. Apenas neste ano, a UNICA veio à Índia três vezes para atividades em parceria com a Indian Sugar Mill Association - ISMA e a Society of Indian Automobile Manufacturers - SIAM. O que o Brasil quer é que a Índia tenha os mesmos benefícios que o Brasil está tendo com o programa, que é a redução da poluição do ar, a destinação do excedente de cana de açúcar e a diminuição das importações de petróleo.
Para finalizar, não podemos deixar de citar os efeitos da pandemia do COVID-19, que causou interrupções nas cadeias globais de valor. A dinâmica de produção, distribuição e comercialização de produtos do agronegócio está passando por profundas mudanças, influenciada por inflexões na estrutura de oferta e demanda em nível internacional. Nesse momento crítico, as cadeias alimentares brasileiras se mostram resilientes, com o agronegócio brasileiro cumprindo seus contratos de exportação sem interrupção. Nesse contexto, uma saída para a crise atual é por meio da cooperação internacional e do fortalecimento de parcerias comerciais. O aprofundamento dos laços entre países como Brasil e Índia, através do comprometimento com a redução de entraves ao comércio agrícola, é um instrumento indispensável para a recuperação econômica mundial e a manutenção da segurança alimentar.
* Eng. Agrº Dalci de Jesus Bagolin - Adido agrícola na Índia
Publicado originalmente em inglês na revista indiana e-GOV