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2º Encontro de Produtoras Rurais foi sucesso

ÁGUA BOA – Nesta quarta-feria, 08/03, o Sindicato Rural de Água Boa sediou o 2º Encontro de Produtoras Rurais de Água Boa. O encontro reuniu dezenas de produtoras, esposas de produtores e associados do Sindicato Rural.

Norma Gatto, agricultora da região de Rondonópolis, foi a presença ilustre da noite. Norma é exemplo de superação. Tornou-se referência na agricultura mato-grossense após uma tragédia, e gosta de compartilhar suas experiências. Porém, ela não se considera palestrante. Por este motivo, sua história foi contada em forma de entrevista, e não de palestra.

Norma Terezinha Rampelotto Gatto, 51 anos, é natural de Salto do Jacuí, RS. Filha de um dentista e produtor rural, jurava, quando solteira, que não se casaria com lavrador: achava aquela vida muito sofrida. Mas o destino quis diferente. Casou-se com um pequeno agricultor, que, em 1975, resolveu acompanhar o sogro numa grande aventura: plantar soja em Mato Grosso. O pai de Norma, Benjamim Rampelotto, hoje com 87 anos e ainda no batente, planta 6 mil hectares de lavouras e cria gado no Pantanal –, foi pioneiro na cultura da oleaginosa na região de Rondonópolis, no sul do Estado, ao lado do genro, Adroaldo Gatto, e do falecido agricultor Adão Salles. 

Quando enfim se mudou para Mato Grosso, em 1979, cinco anos depois da vinda do pai e do marido, Norma foi morar na fazenda, já praticamente toda aberta. Havia bastante movimento, mas o sentimento de solidão foi o que predominou. Além do aspecto emocional, as dificuldades cotidianas – mosquitos, atoleiros, distância da cidade – fizeram com que o casal decidisse viver em Rondonópolis assim que se anunciou a chegada do primeiro filho, Igor. Depois vieram Felipe e Eduardo. 

Até novembro de 2000, Norma foi uma simples dona de casa, administrando a vida familiar e zelando pelos filhos, já adolescentes. Seu marido havia comprado uma área de 1.680 hectares, a Fazenda Argemira, e tocava seu próprio negócio, separado do sogro. Plantava soja e criava gado. Ela não se envolvia nos assuntos da propriedade. Apenas ouvia do marido que, com três filhos, o ideal seria conseguir uma área de uns 10 mil hectares, suficiente para levarem uma vida tranquila. Por conta disso, Adroaldo resolvera vender o gado e investir mais em lavoura; num ano bom, rende bem mais que a pecuária.

Norma Gatto estava em casa, na cidade, quando soube da tragédia. O peão que cuidava do gado há nove anos, insatisfeito com a nova situação e sem querer adaptar-se às atividades na lavoura, havia assassinado seu marido. “A vida, como eu conhecia, acabou ali, naquele instante.” O futuro desapareceu de repente: sonhos, planos, mesmo as tarefas mais simples do cotidiano foram substituídos por uma angústia sem tamanho. Como criar os filhos? O que fazer com a fazenda, onde o plantio estava pela metade? E a terra em Sorriso, recém-adquirida? As contas para pagar, o escritório para administrar, o pessoal no campo, à espera de orientação... Tudo era muito difícil, doloroso. “Nunca me imaginei fazendo isso. Sempre achei que eram tarefas masculinas.” 

Era preciso reagir, sobretudo por causa dos filhos. Em nome deles, Norma Gatto reagiu. Contou, para isso, com apoios que não imaginava. Primeiro, o pessoal da fazenda, que ela pensou que resistiria ao comando feminino, foi compreensivo e solícito: o plantio foi finalizado e as atividades cotidianas tiveram sequência. Depois, ela procurou o Grupo Guará – coletivo de produtores rurais que se reúne regularmente para trocar experiências – e ali encontrou uma verdadeira escola. “Faculdade, mestrado e doutorado”, ela brinca. “Me entreguei de corpo e alma. Não perdia uma reunião. Eu era a única mulher no grupo, não entendia nada do que os homens falavam, mas me esforcei, trabalhei e consegui superar as primeiras dificuldades. Fui secretária e cheguei a coordenadora do Guará. Isso tudo me obrigou a planejar o próprio destino, a dominar a parte técnica, a ter consciência de que a fazenda tem de ser levada como uma empresa.”

Naquela primeira safra à frente da propriedade, Norma colheu 56 sacas por hectare. Uma boa média – e que lhe trouxe certo ânimo. Na segunda, colheu 58 sacas por hectare, produtividade recorde entre os membros do Guará e região. O astral melhorou mais um pouco. Foi apenas no terceiro ano após a morte do marido que ela sentiu que era possível ser mulher e empresária do agronegócio. Suas produtividades chamaram a atenção dos técnicos da Fundação Mato Grosso, que passaram a acompanhar e orientá-la sobre novas variedades, manejo das lavouras e a conveniência da diversificação e da rotação de culturas. Ela cercou-se de auxiliares – agrônomo, administrador, gerente – e assumiu o manche, fazendo decolar o negócio. 

“Mulher é mais pé no chão. Desde criança, a gente só comprava o que podia pagar. Houve anos piores e outros melhores, mas nunca fiquei endividada. Demoro mais para crescer porque a gente tem de estar sempre calçado. Quando está bom, é hora de se firmar, de guardar um pouco para quando a situação ficar difícil. A gente não precisa mais crescer em área, mas sim em produtividade. Para isso, sempre é preciso investir em novas tecnologias.” Hoje, o que a faz feliz é ver que os filhos querem seguir o caminho do pai. Felipe, engenheiro agrícola, cuida da fazenda em Sorriso. Igor, agrônomo, prepara-se para assumir funções nas propriedades. Eduardo está na faculdade, cursando economia, e também demonstra interesse nas atividades familiares. “Não quero que eles passem pelo que eu passei. Delego funções para que tenham oportunidade de aprender enquanto estou aqui, perto. Além do mais, confio no potencial deles.” 

Norma tem feito algumas viagens ao exterior exclusivamente para visitar eventos voltados para a agricultura. Já conhece Estados Unidos, Argentina, Paraguai e Itália. “Me sinto vitoriosa porque consegui superar o desespero e tocar a vida adiante, criar meus filhos e ser uma boa produtora rural. Tornei-me uma referência. Para isso, contei com a ajuda de muitas pessoas.”

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